segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

As representações sociais


Há alguns anos um casal amigo, numa conversa de café, dava-me conta da sua desilusão pelo facto do filho mais velho depois de concluir o décimo segundo ano, ter decidido não ir para a universidade. Tinham feito grandes sacríficios chegando a trabalhar em dois empregos para que o dinheiro chegasse e agora o seu filho recusava tirar um curso superior, dizendo que tinha de resolver a sua vida, conquistar a sua independência.
Onde é que nós errámos? É a frase que normalmente os pais dizem nestas situações. De facto não se trata de um erro, pelo menos premeditado, estão a lutar por uma causa quase perdida e contra um força subtil mas muito poderosa, a representação social.
O termo representação social foi definido pelo sociologo Serge Moscovici em 1961. Este autor procurava estudar a influência daquilo a que Durkheim – outro sociólogo – chamava de consciência social nos pensamentos, nas decisões e até da forma como veem a realidade os membros de um determinado grupo social.
Ao que parece aparentemente existe um “Big Brother” social constituido por tudo aquilo que fomos aprendendo ao longo dos tempos e que inconscientemente utilizamos como as melhores respostas às situações que vão surgindo permitindo não só a resolução de problemas como tambem uma vivência harmoniosa dentro do nosso grupo social.
Como cientista social sempre me impressionou o facto de existirem determinados principios quase sub-liminares que interiorizamos na nossa socialização e que motivam as respostas tidas como “normais” para o grupo social onde estamos inseridos, a ponto de até conseguirmos alterar a nossa percepção sobre as coisas.
De facto aqueles pais na sua procura pela estabilidade económica inconscientemente transmitiram ao seu filho que esse era o verdadeiro objectivo para no futuro poder ter uma família, e mais, que para o conseguir só poderia ser através do trabalho.
Quando estudei a Teoria do Conhecimento na escola secundária , havia um senhor Irlandês de seu nome Berkley que defendia o que ele chamava de” imaterialismo” e que considerava que uma substância material não pode ser conhecida em si mesma. O que, segundo ele, se conhecia, na verdade, resume-se às qualidades reveladas durante o processo perceptivo. Ou seja na pratica quer dizer que o objecto para existir tem de estar relacionado com o sujeito que o vê. Ou metafóricamente: quando uma árvore cai no meio da floresta só faz barulho se alguém ouvir.
Claro que na altura pensei estes filosofos aparecem com cada teoria !!
Hoje passados alguns anos não me parece assim tão absurdo já que as representações sociais moldam a realidade dando pespectivas diferentes da mesma realidade a pessoas inseridas em grupos sociais diferentes.
Uma entrevista feita aos diversos níveis numa grande empresa com apenas uma questão – “Para si o que é o trabalho” – motivou respostas diferentes, claramente ancoradas nas representações sociais. Enquanto que os quadros técnicos falavam no trabalho como forma de realização quer profissional quer pessoal os trabalhadores não especializados falavam em integração social e forma de sustentar a sua familia.
Perante a questão porque é que muitos dos nossos jovens consideram as férias como objectivo e não a carreira profissional? Talvez possamos responder, porque nós adultos trabalhamos o ano inteiro para um mês glorioso de descanso, todos os planos , poupanças e até empréstimos bancários são feitos nesse sentido .
Ou então porque as nossas representações identificam o trabalho como algo não bom. De facto o termo "trabalho" deriva da palavra latina "tripalium", um instrumento de tortura, espécie de açoite usado para obrigar os escravos a trabalhar.


Saudações


O Viajante